sábado, 22 de abril de 2023

*O muro e os "Sinais" de Fernando Alves

Pelas mãos do Carlos “Fota”, repara-se o muro, direito e aprumado na altura, pedra sobre pedra, como se o artesão tivesse na memória os segredos do mestre Hiram Abiff - alegoria exagerada e sem propósito, é bom de ver, o fio de prumo, nesta obra, não é necessário, mas tem preceito quando associado às insignes personalidades de Fernando Vale e Alberto Martins de Carvalho, conterrâneos de quem viu a luz do dia por estas bandas da serra do Açor.
Avança o muro que, segundo o “Fota”, acima do terreno irá crescer nas alturas, mais coisa menos coisa, um metro, e avanço eu no passeio matinal de (quase) todos os dias até ao Casal do Meio, onde Alberto Martins de Carvalho, amigo e correligionário de Fernando Vale, teve casa de férias e eruditas conversas com os seus pares, “discretas e secretas” como convinha na época do Estado Novo.
Na minha companhia vai o “Bello”, o cão, parceiro gentil, famoso pelo nome e figura, aqui e em Coja.
Volto ao muro que o Carlos “Fota” garante, depois de pronto, a contento do dono da propriedade; cumprimento o artesão, olho a obra, e sigo adiante com o pensamento (ainda) em desassossego com os “Sinais” de Fernando Alves desta manhã …
De Torga a Fernando Vale, das rádios da vizinhança à Filarmónica do Barril de Alva, do "Farrosca", o músico de outros tempos, ao paisagista sonoro Luís Antero de agora, se construiu a crónica da TSF, lida pelo autor.
Foi um “desassossego”, sim, a leitura dos “Sinais” de Fernando Alves, que permanece latente pelo relato da sua viagem, carregado de poesia e laivos de saudade quando as palavras tocam ao de leve na ausência física de "(…) Fernando Vale que tanta falta nos faz como a água dos rios (…)”.
Palavras de Miguel Torga:
“A nossa memória está cheia dos nomes desses bem-aventurados que puderam cumprir-se inteiramente nas artes, nas ciências, nas letras, ou na simples maneira de existir. É o caso do Dr. Fernando Valle. Matusalém sem idade, teve tempo para ser no mundo a imagem paradigmática do jovem irreverente, do bom chefe de família, do amigo leal, do médico devotado, do político isento, do governante capaz, do cidadão exemplar” - Miguel Torga.

A memória recente é caduca como folhas de certas árvores.

Depois de pronta, a obra  engrandece a propriedade  do casal
John Stobart (membro da Filarmónica Barrilense),
conhecida por "Quinta das Mimosas" e valoriza o Barril de Alva

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Nota de rodapé. 
- Adaptação do texto publicado no Blog Ritual(idades) em dezembro  de 2022 - CR

Breakfast in Barril de Alva



Os (novos) imigrantes

- A chegada de novos imigrantes à aldeia onde nasci, Barril de Alva, é um registo que tenho à mão e do qual dou fé com agrado.
Vieram de longe, investiram as suas poupanças - “coisa pouca”, quando a intenção é acomodar o repouso espiritual, que vale “fortunas de encanto e beleza”-, recuperaram casas modestas
e outras apalaçadas,
“com vistas largas”…
- Os (novos) imigrantes povoam a Beira Serra pelo deleite da geografia da região, usos e costumes, clima, e pelas gentes,
gentis e hospitaleiras,
solidárias,
teimosos e cabeçudos beirões  (*) - epiteto com que Miguel Torga definiu a crença e perseverança do povo serrano do seu tempo, pelo conhecimento profundo de quando exerceu medicina na região de Arganil e dela desfrutou com os “olhos da alma”,
límpidos de névoas,
que abarcavam o belo do todo com que a Natureza nos brindou.
Um dia, Torga, foi dizer adeus à serra do Açor:
“Com o protesto do corpo doente pelos safanões tormentosos da longa caminhada, vim aqui despedir-me do Portugal primevo. Já o fiz das outras imagens da sua configuração adulta. Faltava-me esta do ovo embrionário” (Piódão, 7 de abril de de 1991).
- Possivelmente, nem todos os imigrantes serão conhecedores da obra de Miguel Torga; em letra de forma, regressa a lembrança de um dos mais influentes poetas e escritores portugueses do século XX, com o intuito da sua descoberta pelos “novos barrilenses”, eventuais leitores deste registo.
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domingo, 16 de abril de 2023

Barril de Alva - retratos


(Imagens recolhidas   nas  publicações  da barrilense Rosa Gouveia,
que dou  à estampa com a devida vénia)